Um dos maiores produtores do mundo, onde ovo e cocô fazem parte da cultura do café
Você deve estar se perguntando se leu direito o título do texto. Sim, é isso mesmo: ovo e cocô! Quer saber mais? Então, vamos nessa!
Ao pensar em países produtores de café, o Vietnã pode não ser o que nos vem logo à mente. No entanto, este país asiático é o segundo maior exportador de grãos do mundo e lar de algumas das práticas cafeeiras mais singulares e intrigantes.
Uma breve história
O café foi introduzido no Vietnã pelos colonos franceses em meados do século XIX. Lá na França, como em boa parte da Europa, já existia uma cultura do café desde os anos 1600. Os franceses tinham grande parte de seu consumo garantido pela produção de café em suas colônias, como as francesas no Caribe.
Com as numerosas revoltas das pessoas que eram escravizadas para trabalhar nas produções de café nessas regiões, em especial São Domingos, as colônias francesas, que antes forneciam dois terços do café consumido no mundo, não podiam mais exportá-lo, pois a produção não era nem suficiente para consumo interno. A Indochina acabou virando, portanto, o foco da colonização francesa.
Em 1857 o café foi levado de Bourboun ao Vietnã, e já foi utilizado para produção na região de Anaam (An Nam), que se manteve pequena até ser interrompida durante a Guerra do Vietnã. Com o fim da guerra, a maior parte da agricultura foi coletivizada pelo governo.
Em 1985 as plantações estatais representavam 70% das terras aráveis nas províncias de Dak Lak, Gia Lai e Kon Tum. Um ano depois, com as reformas econômicas de Doi Moi pelo Partido Comunista que tinha a intenção de criar uma economia de mercado com orientação socialista, as empresas privadas foram autorizadas a atuarem na produção de mercadorias, incluindo o café. Foi então, que a produção cafeeira vietnamita começou a crescer vertiginosamente, quase triplicando entre os anos de 1995 e 1999, para virar o segundo maior exportador do mundo.

Esse crescimento, porém, trouxe desafios. Comunidades indígenas protestaram contra a expulsão de suas terras por grandes empresas, e ambientalistas alertaram para o desmatamento de cerca de 40 mil quilômetros quadrados de floresta desde 1973 (WWF), muitas vezes para dar lugar a plantações de café.
Um local favorável para um bom café
O sudoeste asiático apresenta uma topografia complexa, com montanhas e microclimas ideais para o cultivo de diversas espécies de café. No Vietnã, cultivam-se principalmente as variedades Robusta, mas também há produção de Arábica (Catimor), Excelsa e Liberica.
O café vietnamita
O Vietnã é atualmente o maior produtor mundial de café Robusta. Na safra 2023/24, a produção foi estimada em 26,5 milhões de sacas de 60 kg de robusta, correspondendo a cerca de 36% da produção global dessa espécie.
A produção de café no Vietnã na safra 2024/25 é prevista em 29 milhões de sacas de 60 kg.
Em 2024, o país enfrentou uma queda de 17,2% na sua produção devido a condições climáticas adversas. Além disso, as exportações vietnamitas de café caíram 47%, o que reduziu significativamente a oferta global e pressionou os preços para cima.
Café Phin: o método tradicional
O método mais comum de preparo do café no Vietnã é o “phin”, um filtro metálico individual que permite a extração lenta da bebida. O resultado é um café forte e amargo, geralmente equilibrado com gelo ou gelo e leite condensado.

Se você quiser beber como um local nos cafés do Vietnã, há duas bebidas que você precisa saber pedir – “cà phê sữa đá” (café gelado com leite) ou ca phe den da (café gelado, preto).
O café quente está disponível, mas, geralmente, os moradores aderem às bebidas geladas, inclusive o café, porque o clima é extremamente quente.
Café com… ovo?
Durante a escassez de leite fresco na década de 1940, Nguyen Van Giang, um bartender em Hanói, criou o “cà phê trứng” (café com ovo). A bebida combina café robusta, gemas de ovo batidas, leite condensado e, às vezes, baunilha, resultando em uma mistura cremosa e doce.
Weasel Coffee: o café mais caro do mundo
O “Weasel Coffee” é produzido a partir de grãos ingeridos e excretados por civetas, pequenos mamíferos que selecionam os frutos mais maduros. O processo enzimático no trato digestivo do animal altera o sabor dos grãos, conferindo notas suaves e menos amargas.
Esse é o mesmo Kopi Luwak com o “nome vietnamita”, e temos um artigo completo sobre ele aqui.
Devido à destruição do habitat natural das civetas, muitas fazendas passaram a criá-las para continuar a produção desse café raro, que pode custar até US$ 1.000 por quilo.
Desafio agrícola e humanitário
A atividade agrícola é perigosa no Vietnã, por causa do enorme número de munições não detonadas lançadas pelos Estados Unidos que permaneceram no solo depois da Guerra. Na província de Quang Tri, por exemplo, 83% dos campos estão destinados a conter bombas. Uma loucura, né?
As bombas continuam explodindo diariamente nas mãos de crianças (que as encontram e acham que são brinquedos) e dos agricultores quando removem a terra para lavoura.
Já foram mais de 42 mil pessoas mortas, sem contar as amputadas. Segundo a ONG britânica MAG, são cerca de 10% de bombas entre 15,4 milhões de toneladas de explosivos lançados e que ficaram sem explodir. Levaria mais de 300 anos e mais de 10 bilhões de dólares para limpar as terras de todo o país. Portanto, o foco do projeto passou a ser treinar a população, em especial as crianças, para identificar as bombas e como lidar com elas.
Um dificultador da limpeza das bombas é que grande parte delas, são bombas cluster. Estas bombas são projetadas para ampliar o estrago ao liberar outras pequenas bombas quando atingem o solo.
Existem tratados ratificados por diversos países para impedir a sua produção e extinguir o estoque mundial das bombas cluster. Mais de 120 países já assinaram um acordo, firmado em 2008, mas alguns dos maiores produtores de tais armamentos — incluindo os EUA, a China e a Rússia – se negaram a assinar.
O Brasil também não assinou. Hoje, o Brasil é um dos países que ainda produz este tipo de bomba e há bombas cluster de fabricação brasileira enterradas em países como o Peru e a Colômbia.
Inovações e misturas inusitadas
Além do café com ovo, o Vietnã é conhecido por outras combinações criativas, como café com iogurte, smoothies de café com frutas frescas e até café com sapoti, uma fruta local. As cidades de Hanói e Ho Chi Minh são centros vibrantes dessa cultura cafeeira inovadora.
Curtiu conhecer mais sobre o café no Vietnã?
Alguém aqui já provou um café vietnamita? Por favor, compartilhe suas impressões nos comentários e explore outros destinos cafeeiros ao redor do mundo na série: Café pelo Mundo.
(Blogpost escrito em parceria com a jornalista Carol Lemos.)
Respostas de 5
Muito interessante, Carol e Renata. Parabéns pela série.
Obrigada Adriano 😉
Ótimo texto! Há marcas de café vietnamita que possam ser compradas no Brasil? Poderia indicar algumas?
Oi Luana, tudo bem? Poxa, vendidas por aqui eu não sei…um abraço, Renata
Adorei a matéria sobre o café no Vietnã e eu tomei esse café phin… e uma das vezes o café tava quentinho e o cara me perguntou se eu queria gelo no café. Imagina minha cara! Minhas amigas disseram para eu experimentar. Muito diferente e muito forte. Não dormimos de noite… adorei o Vietnã e comprei o café do cocô do bichinho. Tava procurando algo para escrever sobre o café numa foto que eu postei no instagram.